domingo, 23 de outubro de 2016

A morte da velha senhora

Informações sobre a autora:
Nome: Beatriz da Silveira Sudário Lobo
Pseudônimo: Bartira.

Foi redatora e Colunista do Correio Popular de Campinas. Bibliotecária e Advogada pela Pontifica Universidade Católica de Campinas.
Professora da Pontifica Universidade Católica de Campinas.
Advogada Civil e da Vara da Infância e Juventude.
Hoje, reside em Sousas, distrito de Campinas, com seu marido, filhos, nora e netas.

Este texto, entre outros textos, estiveram adormecidos por anos, guardados em armários e estantes. Conheci dona Beatriz, uma senhora incrível e com textos magníficos que ela guardou com muito carinho. Não há datas neles, mas estejam cientes de que foram escritos há mais de uma década. 
Postarei vários textos de Bartira, aqui. 
Assim como seus textos, este blog esteve adormecido; decidi acordá-los, com a vontade que ela me despertou de acordar meus próprios textos.

                                             Conto: A morte da velha senhora.



A tarde estava quente. Na verdade era morna. O sol é que ardia. O céu era azul metálico e nele flocos de nuvens brilhantes flutuavam. O silêncio predominava. Um silêncio leve, cheio de ruídos distantes de pássaros, vento suave e movimentos rápidos e fugidios de insetos.
Mariana, estava parada, de pé, em frente ao terraço da chácara de sua avó. Era pequena, de formas perfeitas e já acentuadamente femininas. Cabelos lisos e brilhantes até o meio das costinhas de criança. Olhos atentos, movimentos de bailarina.
Mariana riu alto. E correu para dentro da sala espaçosa. 
A avó estendeu-lhes os braços. Mariana, sentou-se no colo da avó. Tagarelando a pequenina continuou no colo da avó que estava sentada em vasta poltrona estofada de marrom escuro. De repente, ela percebeu que sua avó estava parada, não falava mais, sua cabeça pendera de lado e seus braços não mais a seguravam, estavam largados ao lado da poltrona.
Mariana desceu do colo e procurou chamar a avó:
- Vovó! Vovó! A senhora dormiu? Vovó acorde!  
Com as pequenas mãos balançou levemente a cabeça da velha senhora e nada aconteceu; ela continuava inerte. 
A pequenina Mariana sentou-se ao lado da avó. Lembrou-se dela rindo, alegre, dando-lhe chocolate, brincando com ela na vasta cama do quarto; fazendo-lhe carícias, pedidas por ela, até dormir. Contando-lhe estórias e cantando velhas cantigas de ninar. "Nana nenê que a cuca vem pegar. Papai foi na roça, mamãe no cafezal". Vovó sempre protegendo-a, abraçando-a, defendendo-a de tudo e de todos.

Olhou para a fisionomia de cabelos grisalhos. Boca com batom claro e unhas bem cuidadas de esmalte rosa claro. Vovó, dizia que se arrumava e se cuidava para ter aparência agradável aos familiares.
Neste momento, Mariana, olhou para a avó mais nitidamente. Ela estava muito branca e imóvel. Mas, de repente, ela viu uma outra avó. Era a mesma figura dela, mas estava ao seu lado, com o mesmo cabelo grisalho, a mesma roupa daquela inerte na cadeira. Mas, sua fisionomia estava brilhante, parecia flutuar em uma luz interior.
- Querida - disse a figura suavemente - Vovó, precisa ir-se agora. Não tema, não tenha medo. Eu volto para vê-la. Em espíruto, meu amor, porque meu corpo morreu. Ele estava velho e cansado. Não fique triste! Está me entendendo? O espírito da vovó estará sempre ao seu lado, ajudando você como fez quando tinha esse corpo rígido na cadeira. Preste atenção. querida, só você em sua pureza pode me ver, e só pelo meu grande amor que consegui me fazer presente agora. Olhe! Os outros estão chegando. Vovó está bem, porque este corpo era só um envólucro que ela usava. Até mais, querida.
Mariana, olhava admirada, dentro de sua inocência de criança. A figura da avó querida se desvaneceu no ar em um círculo de luz. Ela, estendeu os bracinhos, mas vovó já tinha ido.
 As pessoas chegaram com o socorro médico. Tentaram afasta-la, temiam sua reação devido a grande ligação e afinidade que sempre tivera com a avó.
Mas a pequena criança disse claramente:
- Ela volta para me ver, porque nos amamos muito. Ela só está em outro lugar. 
E pisou a grama estendendo os bracinhos para cima. Todos a olhavam e viram que estendia as mãozinhas e as balançavam ao alto, como se estivesse se despedindo de alguém.